Sábado, 20 de Agosto de 2005

- Olivença, Frei Henrique de Coimbra e a Primeira Missa no Brasil


Olivença, Frei Henrique de
Coimbra e a Primeira Missa no Brasil




«Ao domingo de Pascoela pela manhã,
(26 de Abril de 1500), determinou o Capitão ir ouvir missa e sermão naquele
ilhéu. E mandou a todos os capitães que se arranjassem nos batéis e fossem
com ele. E assim foi feito. Mandou armar um pavilhão naquele ilhéu, e dentro
levantar um altar mui bem arranjado. E ali com todos nós outros fez dizer
missa, a qual disse o padre frei Henrique, em voz entoada, e oficiada com
aquela mesma voz pelos outros padres e sacerdotes que todos assistiram, a
qual missa, segundo meu parecer, foi ouvida por todos com muito prazer e
devoção. Ali estava com o Capitão a bandeira de Cristo, com que saíra de
Belém, a qual esteve sempre bem alta, da parte do Evangelho. Acabada a
missa, desvestiu-se o padre e subiu a uma cadeira alta; e nós todos lançados
por essa areia. E pregou uma solene e proveitosa pregação, da história
evangélica; e no fim tratou da nossa vida, e do achamento desta terra,
referindo-se à Cruz, sob cuja obediência viemos, que veio muito a propósito,
e fez muita devoção. (...) Acabada a pregação encaminhou-se o Capitão, com
todos nós, para os batéis, com nossa bandeira alta.» (Carta de Pero Vaz de
Caminha)



Olivença e o Bispado de Ceuta



Quando Olivença passou a integrar o território nacional, pelo Tratado de
Alcanizes de 1297, manteve-se dependente do Bispado de Badajoz, o mesmo
sucedendo com Ouguela e Campo Maior, que pelo mesmo acto internacional
entraram no espaço de soberania nacional(1). Idêntica situação viveram as
terras de Riba Côa, permanecendo dependentes de Ciudad Rodrigo em matéria
episcopal. Esta falta de coincidência entre as fronteiras políticas de
Portugal e os limites dos seus bispados e arcebispados tinha outros
paralelos mais remotos, não resultando em exclusivo dos acertos territoriais
acordados entre D. Dinis de Portugal e D. Fernando IV de Castela. Nos fins
do século XIV, com o Cisma do Ocidente e o agudizar do conflito
político-militar travado entre Portugal e Castela, desenvolve-se um fenómeno
de nacionalização da igreja portuguesa, passando os nossos territórios
religiosamente dependentes das dioceses de Tuy, Ciudad Rodrigo e Badajoz a
eleger os seus próprios administradores eclesiásticos. O processo culminou
com a união das terras de Riba-Côa ao Bispado de Lamego em 1403 e com a
transferência de Olivença, Ouguela e Campo Maior para o Bispado de Ceuta em
1444. Em 1475 Olivença foi desanexada do Bispado de Ceuta, ficando unida ao
Arcebispado de Braga. Só no reinado do Rei D. Manuel, Olivença foi
reintegrada no Bispado de Ceuta, em resultado de um acordo celebrado em 1512
entre o Bispo desta cidade, Frei Henrique de Coimbra e o Arcebispo de Braga
D. Diogo de Sousa. O território de Valença, que em 1444 havia sido
incorporado no Bispado de Ceuta, transitou pelo mesmo acordo para a mitra
bracarense. A partir de Frei Henrique de Coimbra os bispos de Ceuta passaram
a residir em Olivença. Entre 1513 e 1570 exerceram o seu episcopado nesta
vila os bispos D. Frei Henrique de Coimbra, D. Diogo da Silva, D. Diogo
Ortiz de Vilhegas e D. Jaime de Lencastre. Nesta última data Olivença foi
incorporada na diocese de Elvas, então criada, o mesmo sucedendo com Ouguela
e Campo Maior. Pela mesma altura a Diocese de Ceuta foi suprimida, sendo
reunida ao Bispado de Tânger.



Frei Henrique de Coimbra e a Primeira Missa no Brasil



O primeiro bispo de Ceuta residente em Olivença, apesar de natural de
Coimbra, estava ligado àquela vila alentejana por laços familiares.(2) Antes
de assumir a mitra oliventina fora confessor de D. João II, tendo exercido
magistério confessional no Mosteiro de Jesus de Setúbal.(3) Na viagem de
Pedro Álvares Cabral que em 1500 rumava até à Índia, Frei Henrique de
Coimbra dirigia um grupo de religiosos destinados às missões do oriente.
Frei Henrique de Coimbra destacava-se assim como pioneiro entre os
missionários portugueses em terras Indianas. Antes disso, na passagem da
frota cabralina por terras de Vera Cruz, este franciscano presidiu à
celebração da primeira missa rezada nesta região da América do Sul.
Estava-se a 26 de Abril de 1500(4). Em Calecute, dos oito franciscanos que
compunham a expedição cinco foram mortos em razão do recontro entre os
portugueses e os muçulmanos, na sequência da traição do Samorim. Nesse
incidente foi assassinado o célebre autor da Carta do achamento do Brasil,
Pero Vaz de Caminha. Frei Henrique salvou-se a muito custo, regressando a
Portugal cumulado de glória pelos muitos elogios que sobre os seus feitos
teceu Pedro Álvares Cabral ao Rei Venturoso.(5) O Rei D. Manuel acabou por
escolher Frei Henrique para Bispo de Ceuta, o que foi confirmado pelo Papa
Júlio II em 30 de Janeiro de 1505.(6) Ao tomar posse de Olivença, no
seguimento do acordado com o Arcebispo de Braga em 1512, Frei Henrique de
Coimbra decidiu-se a construir os Paços Episcopais, o Tribunal e o
Aljube(7). Pela mesma época se começou a construir a Igreja de Santa Maria
Madalena de Olivença, «um dos espécimes mais nobres e mais puros do estilo
manuelino»(8), segundo Reinaldo dos Santos; edifício que serviu de Sé
Catedral do Bispado de Ceuta durante quase meia centúria, obra para a qual
terá sido decisiva a acção do seu primeiro bispo. Como preito de homenagem
da catedral ao seu bispo, a Igreja da Madalena, como vulgarmente é chamada
em Olivença, guarda no seu regaço os restos mortais do seu notável prelado,
a quem a monumentalidade da vila tanto deve(9).

Tão intimamente ligada à história de Ceuta, Olivença tal como a primeira
cidade portuguesa de Marrocos vieram a cair nas mãos dos vizinhos espanhóis.
Ambas aguardam hoje a sua Libertação. Marrocos continua a reclamar a entrega
de Ceuta e Melilla esperando apenas tempo mais azado para o conseguir.
Portugal também não esqueceu que Olivença é de direito uma terra portuguesa.
E a História ainda não findou para Olivença. A menos que tenha terminado
para Portugal!?...



(1) Cf. Matos Sequeira e Rocha Júnior, Olivença, Lisboa, Portugalia Editora,
1924, p. 105.

(2) O seu nome seria Frei Henrique de Vasconcelos. Teve alguns familiares em
Olivença, incluindo seu irmão Manuel de Vasconcelos. Vide Amadeu Rodrigues
Pires, «Frei Henrique de Coimbra», in Boletim do Grupo Amigos de Olivença,
Nº 3/4, Lisboa, 1957, p. 6.

(3) Matos Sequeira e Rocha Júnior, ob. cit., p. 107.

(4) A cruz de ferro forjado possivelmente usada na cerimónia está hoje no
Museu da Sé de Braga.

(5) Amadeu Rodrigues Pires, ob. cit. p. 6.

(6) Matos Sequeira e Rocha Júnior, ob. cit., p. 107.

(7) Ibidem.

(8) Reinaldo dos Santos, O Manuelino, Lisboa, Academia Nacional de Belas
Artes, 1952, p. 28.

(9) - Frei Henrique de Coimbra morreu repentinamente em 1532. Esteve
sepultado na Capela-Mor da Igreja da Madalena, talvez em campa rasa, até
1720. Nesta data terá sido transferido para a Capela do Senhor Jesus,
situada na cabeceira da igreja, do lado do evangelho, num sarcófago que tem
a inscrição: «AQVI JAZ HO BISPO DE CEITA DOM ANRIQUE FALECEO A 24 DE
SETEMBRO DE 1532 ANS». Era Mestre em Teologia.

Foi desembargador da Casa da Suplicação, em Lisboa. E por pouco tempo Bispo
desta cidade nos últimos anos da sua vida. Vide Fortunato de Almeida,
História da Igreja em Portugal, Vol. II, Porto, l968, PÁG. 688.


Mário Rodrigues

Amigos de Olivença



















Jornal de Olivença editou às 14:57

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